segunda-feira, 20 de setembro de 2010
A felicidade: mais cedo ou mais tarde, a vida revela-nos tudo
Não consigo contar o número de seres humanos que comigo estiveram no meu tempo de existência. As pessoas marcam-nos com aquilo que são, com as experiências partilhadas, umas inesquecíveis e outras nem por isso. Recordo o tempo em que brinquei com os meus priminhos, as sensações partilhadas com os meus amigos de infância, a pureza do meu primeiro namoro, a minha juventude desbravada pelos espectaculares convívios com os meus amigos da aldeia, até ao dia em que conheci a menina que viria a ser minha esposa, não esquecendo os melhores anos da minha existência, aqueles onde juntos vimos crescer a nossa filha Eduarda. Neste tempo percorrido da minha história somei tantos instantes que compõem actualmente os meus registos de humano.
Das sensações e momentos vividos, carrego no coração muitas somas de tempo de felicidade, mesmo quando as adversidades e contrariedades me fizeram forçosamente efectuar pausas na alegria. Na minha modesta opinião, para termos mais momentos de felicidade, devemos tomar consciência das coisas simples, muitas vezes pouco perceptíveis.
No meu trajecto, aprendi tanto sobre tanta coisa, moldando aquilo que sou, partilhando tempo com pessoas que contribuíram decisivamente para orientar os meus caminhos. Provavelmente, até poderão estar neste momento a questionar o motivo desta minha “ladainha”… Faço-o, porque me apercebo que vivemos num mundo que se expressa cada vez mais controverso, injusto e desestabilizado. Ainda recentemente ouvi numa rádio nacional, um programa que falava sobre uma das muitas contrariedades destes tempos. Ou seja, ao atravessarmos actualmente uma crise grave, existem sectores de actividade que aumentam de forma galopante os seus negócios. São eles as operações estéticas, os SPAS, reservas de hotéis de categoria superior, compra de imóveis e carros de luxo, aumentando significativamente as suas vendas de ano para ano. Não será este aspecto uma enorme falácia para o período desequilibrado em que a sociedade vive? Mais grave se torna quando nos falaram que não são apenas os ricos a requisitarem estes produtos ou serviços. Também uma classe média quase ‘esfarrada’ prefere passar mal, quase sem dinheiro para comer ou dar conforto aos filhos, preferindo estes luxos extravagantes que o consumismo impõe. Que felicidade é esta onde o que conta é a aparência, com um esforço para simplesmente impressionar terceiros?
Quem passear pelas ruas da cidades, pelos centros comerciais, pelas praias e discotecas, vendem-se muitas vezes sonhos, ilusões coloridas de uma esperança que esbarra no parecer. Já ninguém se importa em mostrar ou mostrar-se como verdadeiramente é ou como realmente corresponde às suas origens. Envergonhados, tantas vezes até pelas próprias famílias, anda-se na rua a mostrar aquilo que nunca se teve, quer dentro do coração ou também no interior das suas casas. Não é isto a felicidade. Ela reside nas relações que estabelecemos, independentemente do ter ou do parecer. Só uma condição define verdadeiramente quem consegue obter mais momentos felizes. Passa obviamente por se conseguir ser como é, sem tirar nem pôr mais nada. Isso não invalida que as pessoas deixem de se arranjar ou obter alguns bens de conforto. Mas quando os adquirem, passando muito mal nas questões essenciais da sua vida, torna-se numa opção que hipoteca a área financeira e também a felicidade que disfarçadamente é confundida com o ostentar. Esse estado muitas vezes breve ou relativo do parecer jamais supera o que simplesmente somos, sem manias, vaidades ou superioridades. Mais cedo ou mais tarde, a vida revela-nos que não valeu a pena tanto esforço em vão. O nosso caminho, neste momento conturbado de crise, consiste em fazer o que podemos com o que realmente temos. O nosso caminho, neste momento de ausência de valores, consiste em sermos o que naturalmente somos, respeitando e aceitando com orgulho as nossas origens, condição familiar e pessoal. Assim, só assim, sairemos de uma das crises do mundo: a do ser.
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